sábado, outubro 5, 2024
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Grito da Terra aponta diferença da agricultura familiar do agronegócio


Mãos calejadas e rostos marcados pelo sol. Essas são as características mais visíveis de se observar nos cerca de 10 mil agricultores que atravessaram a Esplanada dos Ministérios nesta terça-feira (21), em Brasília, para participar do 24º Grito da Terra Brasil.

Do alto do caminhão de som, uma lista de demandas era apresentada a cada parada à frente de uma pasta ministerial que, de alguma forma, é responsável por políticas públicas voltadas ao ambiente rural, em especial, aos pequenos e médios produtores que possuem, nas pequenas porções de terra onde vive, o seu sustento ou sua subsistência.

Organizado pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultores Familiares (Contag) e pela Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), o 24º Grito da Terra Brasil teve seu lema “agricultura familiar é alimento saudável e conservação ambiental” reiterado a todo momento por suas lideranças.

“Nossa pauta é centrada em várias questões relacionadas à produção e à reprodução da vida. Com relação à produção, apresentada em abril ao governo propostas voltadas para políticas sociais e alimentares, sempre tendo como referência a sustentabilidade e uma produção alimentar que seja saudável para a população”, resumiu a secretária de Políticas Agrícolas da Contag e coordenadora do 24º Grito da Terra Brasil, Vânia Marques.

Brasília (DF) 21/05/2024 Integrantes do 24º Grito da Terra Brasil fazem passagem na Esplanada dos Ministérios Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil
Brasília (DF) 21/05/2024 Integrantes do 24º Grito da Terra Brasil fazem passagem na Esplanada dos Ministérios Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

Agricultores familiares do 24º Grito da Terra Brasil fazem passagem na Esplanada dos Ministérios – Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil

Além de reivindicar estímulos governamentais à produção de sistemas resilientes às mudanças climáticas, os familiares agricultores defendem também a inclusão produtiva de cerca de 1,7 milhão de famílias que produzem ainda apenas para consumo próprio, sem comercializar seus excedentes.

“Já existem, no Brasil, 5 milhões de famílias que produzem e comercializam. Imagina o quanto agregaremos à economia, ao aumentarmos esse número em cerca de 30%”, defendeu Vânia Marques à Agência Brasil.

Agricultura familiar x agronegócio

Segundo o presidente da CTB, Adílson Araújo, um familiar agrícola responde por 3,9 milhões de estabelecimentos rurais no Brasil e ocupa 23% das áreas cultivadas do país. Responde também por 23% do valor bruto da produção agropecuária e por 67% das ocupações no campo.

“No entanto, enquanto o governo destina R$ 364 bilhões para o agronegócio, destina apenas R$ 77,7 bilhões para a agricultura familiar, que é responsável por 70% dos alimentos consumidos pelos brasileiros. Há que se rever isso, porque grande parte do agro produz apenas para exportação, enquanto os pequenos produtores alimentam a família brasileira”, argumentou Araújo.

As diferenças entre o agronegócio e a agricultura familiar não param por aí. “O pequeno agricultor ara e semeia a terra em seu próprio habitat, e tem mãos calejadas pelo uso de seus instrumentos. Tem também um olhar solidário. Por isso temos como lema a questão da sustentabilidade associada à solidariedade”, disse.

“Já o agro trabalha pensando apenas no grande mercado, sem preocupações com sustentabilidade. O resultado são essas tragédias ambientais que ocorreram, como no Rio Grande do Sul. Eles são, na verdade, grandes empresários que exploram a terra com o objetivo de maximizar seus lucros por meio de produções mecanizadas. Por isso mesmo têm as mãos calejadas. Geram cada vez menos empregos para terem lucros cada vez maiores”, acrescentou.

Regularização de posse

Brasília (DF) 21/05/2024 Integrantes do 24º Grito da Terra Brasil fazem passagem na Esplanada dos Ministérios Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil
Brasília (DF) 21/05/2024 Integrantes do 24º Grito da Terra Brasil fazem passagem na Esplanada dos Ministérios Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

Integrantes do 24º Grito da Terra Brasil fazem passagem na Esplanada dos Ministérios – Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil

Os calos nas mãos do familiar agricultor Valdinei Grigório de Lima, 62 anos, foram adquiridos ao longo de anos nos roçados de mandioca e de milho. Ele produz também leite e capim para gado em um pequeno pedaço de terra em Vila Bela, Mato Grosso. Os peixes de tanque, os porcos e as galinhas ajudam a garantir o sustento, bem como fazer um extra ao comercializar seus excedentes.

O que mais o motivou a encarar 24 horas dentro de um ônibus para chegar ao Grito da Terra é a defesa da reforma agrária. “Queremos regularizar nossas posses”, afirmou em meio a relatos sobre a situação agrária em sua região.

“Vila Bela é uma localidade do tempo da escravidão, com muitos quilombolas que fazem parcerias com os agricultores familiares. Trabalhamos todos juntos, comercializando produtos em um clima de muita solidariedade. Minha posse, inclusive, está localizada em um terreno quilombola”, disse.

“Mas temos muitos problemas com alguns fazendeiros do agronegócio na região. Como são muito ricos, eles compram muitos terrenos, de forma a cercar as áreas dos pequenos proprietários. Depois, dificultaram o escoamento de nossos produtos. Cometem muita maldade mesmo. Já despejaram famílias para tomar suas terras, após apresentarem títulos frios de terras em áreas que são da União ou mesmo quilombolas. A Justiça até diz para a gente não desistir, mas ela nunca chega lá para nos ajudar. Sempre foi assim”, denuncia.

Merenda escolar

Os pés de coco licuri da familiar agricultora Glória Carneiro, 69 anos, são excelentes para fazer cocada. E a cocada comprada pelo governo vira merenda escolar em Várzea da Roça, na Bahia, município a cerca de 300 quilômetros de Salvador.

“Cheguei a produzir e vender, em apenas 6 meses, 1 tonelada de cocada para distribuição entre escolas, eventos e cooperativas de alimentos. Minha casa foi construída com o dinheiro obtido a partir dessa cocada de licuri, um coco pequeno e oleoso, excelente para fazer doce. E o melhor de tudo é que ele vire um alimento bom e de qualidade para os meninos das escolas da região”, acrescentou.

Secretária da Terceira Idade do Sindicato Rural de Várzea da Roça, ela diz que a solidariedade é algo muito comum entre os agricultores. “Não deixamos ninguém passando fome em nossa região. Estamos sempre nos mobilizando para alimentar aqueles que precisam”.

Aposentadoria e Pronaf

Brasília (DF) 21/05/2024 A agricultora familiar Gilda Lima, de Bom Jardim, (PE), participa da passeata do 24º Grito da Terra Brasil na Esplanada dos Ministérios Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil
Brasília (DF) 21/05/2024 A agricultora familiar Gilda Lima, de Bom Jardim, (PE), participa da passeata do 24º Grito da Terra Brasil na Esplanada dos Ministérios Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

Agricultora familiar Gilda Lima, de Bom Jardim, (PE), participa da passeata do 24º Grito da Terra Brasil – Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil

Já a agricultora familiar Gilda Lima, 58, passou 3 dias dentro de um ônibus para ir de Bom Jardim, Pernambuco, município a cerca de 70 quilômetros de Recife, até Brasília.

Presidente do Sindicato Rural da região, ela veio à capital federal com a expectativa de facilitar o processo de aposentadoria dos familiares e mais facilidades de acesso ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), apoio financeiro do governo federal às atividades agropecuárias exploradas através do emprego direto da força de trabalho do produtor e de sua família.

“Queremos também políticas públicas mais externas às mulheres, em especial para as mães. Há muita burocracia para conseguirmos o salário-maternidade. No caso do INSS, eles pedem muitos materiais disso e coisas. São muitas dificuldades para o agricultor idoso, que acaba tendo de se deslocar demais para conseguir aquilo que lhes é de direito”, disse a produtora de milho, feijão, fava, mandioca, batata, galinha e ovo.

“Tenho uns bois também. Às vezes vendo a carne deles para comprar outros bois”.



AGENCIA BRASIL

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