segunda-feira, outubro 7, 2024
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Câmeras policiais geram debate entre ministério, STF e Defensoria



No último dia 22, o governo de São Paulo lançou um edital para a contratação de 12 mil novas câmeras corporais para policiais, provocando um debate nacional devido às mudanças no modo de gravação das imagens. Em resposta, um Defensoria Pública de São Paulo acionou o Supremo Tribunal Federal (STF), eo Ministério da Justiça e Segurança Pública publicou novas diretrizes sobre o uso desses equipamentos.

O estado de São Paulo possui 10.125 câmeras em uso espalhadas em 62 batalhões de polícia. Das 12 mil novas câmeras, 2 mil serão adicionais e 10 mil substituirão as existentes, representando um aumento de 20% no equipamento.

Como funciona o modelo atual de gravação das câmeras

Atualmente as câmeras utilizadas pelos policiais do estado de São Paulo possuem duas modalidades de gravação, rotina e ocorrência.

A gravação de rotina registre todo o turno policial (12 horas) de maneira ininterrupta, sem necessidade de acionamento. De baixa qualidade e sem áudio, fica armazenado por dois meses.

A gravação de ocorrência, por sua vez, se inicia quando o policial aciona um botão, de maneira que a captura de imagem e de áudio passa a ocorrer em alta qualidade. Elas são armazenadas por um ano.

Mudanças no novo edital das câmeras policiais

O novo edital não especifica gravações de rotina, mas apenas gravações de ocorrência, o que gera preocupações sobre possíveis lacunas nos registros das atividades dos agentes. Além disso, o edital permite o acionamento remoto das câmeras pelo Centro de Operações da Polícia Militar (Copom) e a transmissão ao vivo pela internet para o Copom. De acordo com a Secretaria da Segurança Pública, o novo equipamento será mais moderno, permitindo a leitura de placas de veículos e reconhecimento facial.

O edital exige que as empresas comprovem a capacidade de fornecer apenas 500 câmeras, o que equivale a 4% do total contratado, uma redução significativa em relação aos 50% exigidos anteriormente. Especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo alertam que isso pode atrair empresas sem condições de fornecer todo o equipamento contratado. A expectativa do governo é economizar com o novo contrato de 30% a 50% em relação ao contrato anterior.

Em nota, a Secretaria de Segurança Pública afirma que as recomendações do Ministério da Justiça e Segurança Pública são seguidas pelo estado de São Paulo desde 2020. “As diretrizes do Ministério da Justiça para o uso de câmeras corporais vão ao encontro do modelo adotado pela PM de São Paulo. Todas as situações descritas para o funcionamento das corpos corporais já estão inseridas no protocolo operacional da corporação, em vigor desde 2020”.

A pasta também informa que “o acionamento do equipamento é obrigatório e o descumprimento da norma resultará em deliberação ao policial, de acordo com todos os ritos de investigação e eventuais limitações pela corporação para os casos de desvio de conduta”.

Defensoria Pública aciona o STF contra edição de câmeras em São Paulo

A Defensoria Pública de São Paulo protocolou, nesta segunda-feira (27), uma petição no STF solicitando a revisão do novo edital para a contratação de 12 mil câmeras corporais para o PM.

Os defensores públicos destacam que o novo modelo de câmera permite ao policial ativar ou não a gravação, diferente do modelo atual, que grava durante todo o turno de serviço sem interrupção.

A Defensoria solicita ao STF que obrigue a pasta da Segurança a utilizar câmeras corporais em batalhões que realizem operações policiais, como a Operação Escudo e Impacto. Além disso, pede-se que o novo equipamento permita a gravação automática e intencional, que as imagens armazenadas sejam feitas por 2 meses para gravação de rotina e por 1 ano para gravação intencional, e sejam estabelecidos requisitos claros para a escolha da empresa vencedora do edital.

A Defensória pede urgência ao STFpois o edital está previsto para ser concluído em 10 de junho.

Barroso dá 72 horas para governo de SP se manifestar sobre edital de câmeras

O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, concedeu nesta quarta-feira (29) um prazo de 72 horas para que o governo paulista explique o edital de contratação das 12 mil novas câmeras corporais para o PM.

Barroso solicita que o Ministério Público de São Paulo e a Procuradoria-Geral da República se manifestem sobre o edital dentro do mesmo prazo. O ministro é relator de um pedido de revisão do edital apresentado pela Defensoria Pública de São Paulo e por entidades de direitos humanos.

“Intimem-se, pelo meio mais expedito à disposição do juízo, o Estado de São Paulo, a Procuradoria-Geral da República e o Ministério Público do Estado de São Paulo, a fim de que se manifestem sobre o pedido em 72h”, determinou.

Novas diretrizes para investigações corporais publicadas pelo Ministério da Justiça

Na quarta-feira (28), o Ministério da Justiça e Segurança Pública publicou novas diretrizes sobre o uso de câmeras corporais por policiais. O documento determina que o equipamento deve ser obrigatoriamente acionado durante operações, ocorrências e contatos com presos.

As regras se aplicam a policiais militares e penais, especificando 16 situações em que as câmeras devem estar ativas, com a única exceção sendo em momentos de privacidade. As situações incluem:

  • Atendimento de ocorrências;
  • Atividades que exigem atuação ostensiva;
  • Identificação e verificação de bens;
  • Buscas pessoais, veiculares ou domiciliares;
  • Ações operacionais, inclusive aquelas que envolvem manifestações, controle de distúrbios civis, interdições ou reintegrações possessórias;
  • Cumprimento de determinações de autoridades policiais ou judiciárias e de mandados judiciais;
  • Perícias externas;
  • Atividades de fiscalização e vistoria técnica;
  • Ações de busca, salvamento e resgate;
  • Escoltas de custódia;
  • Todas as interações entre policiais e custodiados, dentro ou fora do ambiente prisional;
  • Durante as rotinas carcerárias, inclusive no atendimento a visitantes e advogados;
  • Nas intervenções e resolução de crises, motins e rebeliões no sistema prisional;
  • Nas situações de oposição à atuação policial, de potencial confronto ou de uso de força física;
  • Nos sinistros de trânsito;
  • No patrulhamento preventivo e ostensivo ou na execução de diligências de rotina em que ocorram ou possam ocorrer prisões, atos de violência, lesões corporais ou mortes.

Embora a adesão dos estados não seja obrigatória, o governo Lula (PT) recomenda a correção das diretrizes. “Essa portaria não tem a intenção de conflitar com quem quer que seja, mas simplesmente estabelecer paradigmas. Elaboramos diretrizes nacionais para o uso das câmeras. Nós vivemos num Estado federal, onde cada ente é independente”, afirmou o ministro Ricardo Lewandowski.

Coronéis divergem sobre câmeras policiais

O coronel reformado e ex-secretário nacional de Segurança, Jose Vicente, critica a direção de São Paulo que permite aos policiais decidirem quando ativarem as câmeras corporais. Ele argumenta que, se os policiais tiverem essa escolha, podem evitar situações conflitantes. “Uma gravação de 12 horas capturando todas as imagens durante o turno de trabalho. Deixar a ativação ao recrutamento dos policiais é um retrocesso, pois muitos não irão gerar situações que possam comprometê-los.”

Vicente cita exemplos internacionais onde o método de acionamento de gravação pelos próprios policiais não obteve sucesso. “Uma experiência com a polícia da Califórnia mostrou que muitas situações que deveriam ser gravadas não foram, devido à decisão dos policiais. Isso é uma carta branca para que evitem a gravação quando conveniente.” Ele ressalta a importância das câmeras para melhorar a qualidade do trabalho policial, ajustando procedimentos e aperfeiçoando práticas.

Por outro lado, o coronel reformado Flávio Fabri, ex-comandante do Departamento PM Vítima, também reconhece a importância das câmeras corporais, mas vê benefícios na flexibilidade de funcionamento. “Qualquer ferramenta que aumente a transparência e a produção de provas é útil. Permitir que os policiais decidam quando gravar não é necessariamente um retrocesso, especialmente quando os cidadãos têm de ser expostos ao fornecer informações.”

Fabri enfatiza que as mudanças na PM devem ser baseadas em experiências de policiamento. “A alteração de sistemas deve ser baseada nas lições aprendidas. É fundamental ouvir as instituições que utilizam as câmeras e a experiência de quem já usou. Como disse um famoso juiz carioca, ‘o mundo das ruas é diferente dos gabinetes’.”



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