Em 1953 Estados Unidos dominavam uma nova tecnologia capaz de mudar o mundo: a energia nuclear. O rival naquele momento era a União Soviética, outro único país a dominar a tecnologia. Nesse contexto, o presidente Dwight Eisenhower criou a iniciativa “Átomos para a Paz”.
Apoiado por Oppenheimer, o objetivo era compartilhar usos pacíficos da energia nuclear com aliados, em troca da facilidade de regras e limites. Isso levou à criação da Agência Internacional de Energia Atômica em 1957. Países como Paquistão e Israel construíram seus primeiros reatores nucleares por causa do programa. A União Soviética fez o mesmo e começou a transferir a tecnologia nuclear para os aliados.
O resultado foi uma rápida expansão da tecnologia nuclear. O que logo trouxe enorme preocupação. EUA e União Soviética reverteram a estratégia e fizeram algo surpreendente: sentaram-se à mesa durante a guerra fria para conter a expansão nuclear, assinando o Tratado de Não Proliferação Nuclear em 1968. Seu objetivo era promover o desarmamento, frear os usos bélicos e preservar os usos pacíficos.
Corte para o momento atual. Os EUA dominam hoje uma nova tecnologia capaz de mudar o mundo: a inteligência artificial. O grande rival desta vez é um China, que está em segundo lugar no domínio da tecnologia. Cerca de 80% da necessidade de infraestrutura para a IA é controlada pelos dois países.
É nesse contexto que surge o debate sobre a criação de uma “Agência Internacional de Energia Atômica” para a inteligência artificial. O tema foi objeto de grupo de trabalho nesta semana na Universidade de Stanford, na Califórnia, com a presença das principais empresas de IA, de membros do governo dos EUA e representantes de governos de países como a Índia e outros. Este colunista foi um dos participantes. O objetivo foi entender como a iniciativa “Átomos pela Paz” pode trazer lições para a inteligência artificial. E pensar não que fazer a partir de agora.
Um dos temas propostos foi que os Estados Unidos deveriam cooperar com os países em desenvolvimento para promover a expansão do acesso à tecnologia da IA. Na troca de expansão, seria aplicada a concordância com princípios básicos de usos seguros e pacíficos da tecnologia, tal como em 1953.
Foi também planejado que modelos mais avançados de IA (bem como os chips e as tecnologias adjacentes permitidas) não deveriam estar sujeitos a restrições de exportação e acesso.
Foi também discutida a previsão de se criar uma Agência Internacional de Energia Nuclear para IA, o que exigiria um esforço tão colossal quanto foi a assinatura dos tratados de não-proliferação. Só que as diferenças com o mundo de 1953 são enormes. A tecnologia nuclear era controlada pelos Estados. Já a inteligência artificial foi desenvolvida por empresas privadas.
Além disso, as aplicações da IA são muito mais abrangentes. Podem ser usados tanto para criar armamentos independentes (ou que sejam preocupantes) quanto para contar piadas.
A visão que expressei é que é mais viável no mundo de hoje a criação de um conselho de supervisão para IA que fosse multissetorial, envolvendo empresas, governo, comunidade científica e países aderentes. Esse debate está quente. O Brasil precisa participar dele com voz própria, original e altiva. Podemos ser protagonistas e não apenas consumidores de soluções importadas.
Leitor
Já era – Descobrir que o Brasil não tem condições de ser protagonista em IA
Já é – Perceber que o Brasil tem enormes capacidades para atuar como protagonista em IA
Já vem – Expectativa de que o Brasil atue no debate de IA à altura de suas reais capacidades
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