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Ministério pressiona empresas por logística reversa – 16/06/2024 – Mercado


O sistema de logística reversa brasileiro —que avança a passos lentos e é cercado de críticas— deverá enfrentar, nos próximos meses, um aumento da cobrança por resultados de reciclagem efetiva, e uma pressão sobre os responsáveis ​​pelo cumprimento de metas vai subir.

O Ministério do Meio Ambiente (MMA) vem elaborando uma série de novos decretos e portarias para detalhar as funções de cada agente no processo de destinação adequada do lixo. Segundo o secretário nacional de Meio Ambiente Urbano, Adalberto Maluf, a ideia é tentar organizar os dados, coibir fraudes e identificar maquiagens de números.

“Muitas vezes, nem o CEO da empresa sabe [se sua meta de logística reversa está sendo cumprida]. Então, vamos fazer um decreto para tudo. Vamos subir a régua. Todo mundo vai ter que fazer”, diz Maluf.

O debate gira em torno da seguinte questão: de quem é a responsabilidade pela destinação ambientalmente adequada de um descarte quando o consumidor compra uma embalagem moderada de xampu, descarta o celular de modelo antigo ou troca um pneu velho de seu carro?

Desde a aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), em 2010, não existe no país a obrigação de que fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes de diversos setores destinem o lixo que a sociedade despeja depois de usar seus produtos.

“Não é só o dono da marca [do produto] que tem de cumprir meta de reciclagem. Quem fabrica a embalagem, quem envia, quem vende, todos têm metas, que não são voluntários”, diz Maluf.

“A lei brasileira fala de responsabilidade compartilhada entre fabricante, importador, distribuidor e comerciante. Os decretos vão explicar com clareza. No modelo europeu, está consagrada a responsabilidade integral do produtor (REP), que é o dono da marca. Mas, no Brasil , essa responsabilidade é compartilhada até com o consumidor, que precisa levar a descarga até o ponto de coleta”, explica.

Na avaliação do secretário, ainda é preciso melhorar os critérios dos relatórios de resultados produzidos pelas chamadas entidades gestoras, que representam as companhias na implementação da logística reversa, consolidar e divulgar os números da reciclagem de cada setor.

Segundo Maluf, há casos de entidades gestoras que declaram um determinado resultado de recuperação de resíduos para o ministério, mas apresentam dados discrepantes para o mercado.

O secretário afirma que já fez parcerias com o Ministério Público e com a Receita Federal e está concluindo acordos com as Receitas estaduais para cruzar dados de prestação de contas dos volumes de produtos vendidos com o total de extração recuperado.

Na prática, a logística reversa abrange um conjunto de medidas como a instalação de pontos de entrega voluntária (PEVs), a estruturação de cooperativas com centros de rastreamento mecanizados ou manuais, e outras iniciativas que incentivam o retorno do produto após o uso para as fábricas ou seu encaminhamento para a reciclagem.

Para funcionar, o processo exige o encadeamento das atribuições de diversos agentes, ou seja, o consumidor entrega uma embalagem de medicamento ao comerciante, e o distribuidor vai enviar ao fabricante ou importador, o que dará a destinação adequada ao descarte.

A PNRS de 2010 prevê, genericamente, que a logística reversa deve ser rompida pelos fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, mas o detalhamento da implementação ao longo dos anos, nas principais indústrias, foi feito por meio negocial, ou seja, em contratos acordados por acordos setoriais e termos de compromissos. Tais instrumentos detalham a forma de financiamento, as obrigações de cada elo da cadeia de fornecimento, a forma de participação dos consumidores e metas.

Para Adalberto Maluf, a assinatura de acordos setoriais e termos de compromisso foi útil no passado, enquanto os decretos são mais adequados ao momento atual.

“Lá em 2015 [quando foi assinado um grande acordo setorial da logística reversa que regulamenta o fluxo das embalagens], o setor privado não tinha maturidade. Em 2020, dez anos depois da PNRS, esses acordos se tornaram frágeis porque, se as empresas não cumprem, não têm como responsabilizá-las. O acordo setorial foi importante para dar maturidade à logística reversa, mas agora fizemos as nossas contas e vamos fazer decretos por tipo de material”, afirma.

Além da promessa de maior escrutínio pelo ministério, o mercado terá de se adaptar à virada da meta de recuperação de embalagens previstas no Planares (Plano Nacional de Resíduos Sólidos)instituído por decreto em 2022.

Neste ano, a meta obrigatória para a recuperação de embalagens pós-consumo salta de 22% para 30%, o que deve acelerar o aperfeiçoamento do sistema de logística reversa no país, segundo o advogado Fabricio Soler, da consultoria S2F Partners, especializada em resíduos .

“Será um ano importante para mensurar resultados, entender desafios e dar um direcionamento para fortalecer os investimentos de estruturação da cadeia. Acredito que nos permitirá entender com mais clareza qual é o tamanho da reciclagem de embalagens no Brasil, os materiais que foram recuperados, as regiões com melhores índices e os próprios desafios, por exemplo, que levam a coletas menores em alguns estados”, afirma Soler.

Para Carlos Silva Filho, presidente da Associação Internacional de Resíduos Sólidos (ISWA), os números estão muito distantes do potencial de riqueza que o país pode gerar a partir do seu lixo.

“Até 2022, não tinha meta clara, e tudo era negociado em cada acordo. A partir do Planares, tem meta, e a primeira é em 2024. Só que o país continua com um universo limitado de empresas que o cumprem”, diz Filho.

Para ele, a discrepância entre os valores de logística reversa homologados pelo Ministério do Meio Ambiente e os números listados em muitos dos relatórios apresentados por empresas ao mercado mostram que o chamado lavagem verde [falsas alegações sobre sustentabilidade e circularidade] superestima os resultados.

“Se o Brasil gera aproximadamente 80 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos por ano, e um terço disso são frações secas, como papel, papelão, plásticos e alumínio, o nosso potencial de aproveitamento desses resíduos seria 25 milhões de toneladas. Em dois anos , só foram certificados 2 milhões de toneladas, ou seja, muita gente não está fazendo nada nesse processo”, diz Silva Filho.



FOLHA DE SÃO PAULO

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