Ó inferno astral de Fernando Haddadgerada após a devolução parcial da medida provisória que restringiu o crédito do PIS/Cofins e a pressão redobrada do mercado para cortes de gastos, teve um refresco nos últimos dias.
A decisão unânime do Copom (Comitê de Política Monetária) de manter a taxa de juros em 10,5% ajudaram a desanuviar um pouco o ambiente e diminuir a temperatura elevada em Brasília e no mercado financeiro.
Haddad não bateu na decisão de interrupção a queda da taxa Selicapesar da intervenção orquestrada pelo Palácio do Planalto para atacar o presidente do Banco CentralRoberto Campos Neto, na véspera da reunião.
Favorito para ocupar o lugar de Campos, o diretor de Política Monetária do BC, Gabriel Galípolo, que votou junto com Campos Neto, foi poupado.
A intervenção de Lula contra o BC e o voto de Galípolo reforçaram a posição de independência do diretor, que esteve em xeque desde o Copom dividido entre diretores “lulistas” e “bolsonaristas” na reunião anterior, em maio.
No Congresso, tem quem implementou uma estratégia de Lula por trás do movimento, já que a expectativa era de unidade na decisão, de acordo com os sinais dados por Galípolo nas semanas após a polêmica reunião de maio.
A posição de Haddad ajudou a evitar uma eventual escalada das turbulências, ainda que o presidente Lula tenha retomado o tiroteio nesta sexta-feira (21) ao chamar Campos Neto de adversário político e ideológico.
O que chamou a atenção dos movimentos nos últimos dias foi que as equipes de Haddad e da ministra Simone Tebet (Planejamento e Orçamento) pararam de bater cabeça em torno da resposta à pressão por revisão de gastos.
Até então, o que se viu era uma mistura de propostas de todos os tipos no cardápio de medidas. Entre elas, medidas que não resolvem diretamente o problema de corte de despesas.
Foi o caso da chamada DRU, mecanismo que permite ao governo federal utilizar livremente um percentual de todos os tributos federais garantidos por lei a fundos ou despesas e que é sempre prorrogado.
A DRU não resolve o problema fiscal e não está no cardápio de medidas do Ministério da Fazenda como solução para reduzir despesas. O mecanismo não reduz despesas, apenas facilita o pagamento dela.
O pior que pode acontecer neste momento é a descoordenação na estratégia.
No segundo ano do governo Bolsonaro, o ministro Paulo Guedes lançou a agenda da “PEC DDD”, ou “3D” (Desvincular, Desindexar e Desobrigar), sem combinar com Bolsonaro e as lideranças do Congresso. Não avançou em nada.
Não se deve desprezar a importância da participação do presidente Lula em duas reuniões sobre revisão de gastos. É pouco, mas é muito.
Em Brasília, não há temperatura que se mantenha elevada por muito tempo em torno de um único assunto. Isso não significa que o problema esteja resolvido.
Haddad e Tebet deverão apresentar medidas concretas e as ferramentas para conseguir implementá-las.
O pior que pode acontecer é um choque de expectativas ao contrário. Era isso que estava em gestação com a descoordenação da ação da equipe econômica em torno do cardápio de medidas para reduzir os gastos.
Existem reformas nos gastos que bloqueiam o tempo para ficarem maduras e se viabilizarem politicamente. Foi o que aconteceu com a reforma da Previdência, aprovada em 2018.
Não dá para ignorar que quando senadores e deputados aprovaram, em 2018, a PEC da Transição, com aumento de R$ 168 bilhões de despesas, e depois o arcabouço fiscal, contrataram um ajuste gradual. Ele não estava no preço da nova regra fiscal.
O governo não pode atropelar o ajuste fiscal de curto prazo. Seria um desastre fugir do contingenciamento de despesas, se ele se mostrar necessário, como os números em alta da Previdência indicam. Esse é o principal teste para Haddad e Tebet neste ano.
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