O ex-CEO da Americanas, Miguel Gutierrez, e a ex-executiva Anna Saicali foram incluídos na difusão vermelha da Interpol após serem alvos de mandato de prisão da Polícia Federal. Os dois são investigados pelo rombo de mais de R$ 20 bilhões nas Americanas.
A difusão vermelha é o sistema utilizado para que a ordem de prisão de pessoas que se encontram no exterior seja divulgada e para que os países que integram a Interpol possam cumprir o mandato em caso de deslocamento dos alvos.
Gutierrez e Saicali são alvos de mandatos de busca e apreensão e prisão preventiva na manhã desta quinta (27). O ex-CEO deixou o logotipo do Brasil após sair do comando da empresa. Ele tem dupla nacionalidade, brasileira e espanhola.
Saicali, segundo apurou a Folha, também deixou o país. Contatada, a assessoria de Saicali não se pronunciou; A defesa de Gutierrez não foi encontrada até as 9h15 desta quinta.
A investigação da Polícia Federal Sobre as fraudes na Americanas mostram que o ex-CEO, Miguel Gutierrez, vendeu R$ 158 milhões em ações da empresa após saber que seria substituída do comando e que as irregularidades descobertas.
No total, 11 ex-executivos da empresa venderam mais de R$ 250 milhões após o aviso de troca de comando na empresa.
Os dados encontrados na apuração mostram que as ações foram negociadas a partir de julho de 2022, quando Gutierrez foi informado de que Sérgio Rial assumiria seu lugar no comando da empresa.
A informação é utilizada por pesquisadores para enquadrar Gutierrez e outros investigados no crime de uso de informação privilegiada.
Esse tipo de crime ocorre quando uma pessoa usa uma informação relevante, ainda não divulgada ao mercado, e qual somente tem acesso devido à carga ou posição para obter algum tipo de lucro
No caso concreto, como Gutierrez sabia que as ações iriam desvalorizar com a revelação das fraudes, diz a PF, ele usou essas informações para vender as ações em um preço superior, antes de todos saberem dos futuros prejuízos da Americanas.
Além de Gutierrez, que encabeça a lista de executivos que mais venderam ações, Anna Saicali vendeu R$ 57 milhões em ações a partir de julho de 2022.
Os outros executivos que negociaram ações a partir do anúncio da saída de Gutierrez do comando da Americanas, segundo a PF, foram: José Timotheo de Barros (R$ 20,2 milhões), Márcio Cruz Meirelles (R$ 5,5 milhões), Carlos Padilha (R$ 987 mil), Murilo Correa (R$ 2,8 milhões), Fabio Abrate (R$ 5,8 milhões), João Guerra (R$ 3,8 milhões), Jean Lessa (R$ 1,1 milhão) , Maria Christina Nascimento (R$ 414 mil) e Raoni Lapagesse (R$ 1,2 milhão).
Eles também são alvos da operação deflagrada pela PF e batizada de “disclosure”, termo em inglês usado no mercado financeiro para divulgação de informações para dar transparência à situação econômica de uma empresa.
Cerca de 80 policiais federais cumpriram dois mandados de prisão preventiva e 15 mandados de busca e apreensão nas residências dos ex-diretores das Americanas localizadas no Rio de Janeiro. Além disso, a Justiça Federal determinou o sequestro de bens e valores de ex-diretores que somam mais de R$ 500 milhões.
Entre outros elementos, a ação da PF tem como base os acordos de colaboração premiada de Marcelo Nunes, que foi diretor financeiro da empresa, e Flávia Carneiro, responsável pela Controladoria da B2W.
A investigação aponta que as irregularidades praticadas pelos ex-funcionários da empresa tinham como objetivo alcançar metas financeiras internacionais e fomentar bonificações. Por outro lado, a ação dos investigados manipulava e aumentava de forma ilícita o valor do mercado das ações da empresa.
São investigados os crimes de manipulação de mercado, uso de informação privilegiada e associação criminosa. Em caso de entrega, as penas chegam a até 26 anos de reclusão. As medidas da operação policial desta quinta foram autorizadas pela 10ª Vara Criminal Federal do Rio de Janeiro.
O rombo nas contas da Americanas foi revelado no início de 2023, quando a empresa informou ao mercado inconsistências contábeis da ordem de mais de R$ 20 bilhões, levando um varejista a entrar em um processo de recuperação judicial.
Estudos produzidos pela própria companhia apontaram que as inconsistências eram, na verdade, fraudes contábeis cometidas por ex-funcionários da rede varejista.
Ao informar à CVM, em novembro de 2023, o quarto adiamento da divulgação das projeções financeiras de 2022 e da revisão do balanço de 2021, a empresa afirmou que foi “vítima de uma fraude sofisticada e muito bem arquitetada, o que tornou a construção e análise de suas projeções financeiras históricas uma tarefa extremamente desafiadora e complexa”.