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Americanas: advogados acham difícil extradição de ex-CEO – 28/06/2024 – Mercado


É provável que o ex-CEO das Lojas Americanas Miguel Gutiérrez, preso na manhã desta sexta-feira (28) em Madriseja extraditado para o Brasil nos próximos dias, segundo advogados ouvidos pela Folha. O executivo é acusado de lavagem de dinheiro, uso de informações privilegiadas e manipulação do mercado.

Gutierrez tem cidadania espanhola, o que diminui a possibilidade da Justiça espanhola aceitar a extradição do executivo. Isso porque, no mundo jurídico, leva-se em conta o fator “reciprocidade” —e, como o Brasil não extradita cidadãos brasileirosainda que condenados em outros países, dificilmente a Espanha aceitaria tomar essa atitude.

“O Brasil vai pedir a extradição, mas a Espanha não deve dar. Há uma exigência normal entre os países democráticos que levam em conta a reciprocidade”, diz o criminalista Cezar Roberto Bitencourt.

O pedido de extradição deve sair da Polícia Federal, passar pela Justiça e ser autorizado pelo Ministério da Justiça. Logo em seguida, um pedido é encaminhado ao Itamaraty para que seja remetido à Justiça espanhola.

Os dois países firmaram, no final da década de 1980, um tratado que autoriza a extradição de condenados; assim, uma pessoa condenada pela Justiça brasileira que esteja na Espanha pode ser presa e extraditada para o Brasil e vice-versa. O processo vale para aquelas penas superiores a um ano.

O decreto que regulamenta o tratado, porém, aponta que “quando uma pessoa reclamada por nacional do Estado requerido, este não será obrigado a entregá-la”, ainda que o país natural do tenha condenado a obrigações de julgá-lo. A regra vale também para pessoas que não nasceram no país, mas, por algum motivo, têm cidadania local.

Por Gutierrez ainda não ter sido julgado no Brasil e sua prisão ser preventiva, o processo de uma eventual extradição se torna ainda mais difícil.

“A prisão preventiva no Brasil, por ter caráter preliminar, ainda pode ser acolhida pela Justiça espanhola”, diz o advogado especialista em ciências criminais Berlinque Cantelmo. “Mas nada impede que ele responda pelo crime na Espanha”, acrescenta.

Além disso, caso a Polícia Federal tenha indícios de que o executivo ainda esteja cometendo crime na Espanha, a Justiça brasileira pode autorizar o compartilhamento da investigação com autoridades espanholas e pedir que Gutierrez seja preso em Madri.

“Se ele estiver de fato atrapalhando as investigações, estará cometendo crimes de lá e, por isso, poderá ser preso preventivamente na Espanha”, diz Cantelmo.

Matheus Guimarães Cury, advogado criminalista e professor universitário da Unisantos, diz que, para Gutierrez continuar preso na Espanha, seria necessário que o executivo já tivesse sido condenado no Brasil, a exemplo do que aconteceu no caso Robinho —quando a Justiça brasileira autorizou a prisão do ex-jogador de futebol com base na reportagem dele por estupro na Itália.

Já Ana Colombo, advogada de direito penal do Silveiro Advogados, argumenta que o tratado entre Brasil e Espanha prevê a possibilidade de extradição tanto de pessoas que já tenham sido condenadas, quanto daquelas que estejam respondendo a um processo penal, o que permitiria a extradição de alguém alvo de prisão preventiva. Pesa nesse caso, porém, segundo ela, o fator “reciprocidade”.

“A gente sabe que, nesses casos, muitas vezes o princípio da reciprocidade se sobrepõe. O Brasil estabelece as disposições de extraditar seus nacionais. Então, como o Brasil não entregaria um cidadão brasileiro para a Espanha, é possível que a Espanha adote a mesma lógica e não entregue um cidadão espanhol, ainda que não nativo, mas naturalizado, para o Brasil”, diz Colombo.

Para a PF, um dos motivos da prisão de Gutierrez é que o crime de lavagem de dinheiro ainda está ocorrendo com o objetivo de “ocultação patrimonial”.

Outro motivo é uma suposta tentativa de fuga. Segundo a PF, Gutierrez deixou o Brasil em 29 de junho de 2023, após instauração do inquérito pela PF e depois da criação da CPI sobre o tema no Congresso.

Emails e anotações descobertas em um iPad, diz a PF, mostram que Gutierrez criou um “engenhoso esquema societário, com diversas remessas de valores a offshores sediadas em paraísos fiscais”.

“As anotações do iPad também demonstram a preocupação de Miguel Gutierrez em blindar o seu patrimônio após deixar seu cargo de diretor presidente das Americanas, sabendo que o escândalo iria explodir”, diz a PF.

O “plano” de Gutierrez, diz a PF, consistiu em transferir todos os imóveis que estavam em seu nome para empresas ligadas a familiares e enviar valores a empresas ligadas a ele e a seus familiares no exterior.

“Foram descobertas notas que ilustram o esquema societário com remessas de valores, empréstimos e doações entre as empresas ligadas a Miguel Gutierrez”.



FOLHA DE SÃO PAULO

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