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A inteligência artificial é pirata? – 30/06/2024 – Ronaldo Lemos


Nesta semana, a empresa de inteligência artificial Suno foi processado pela Sony, Warner e Universal, como três maiores gravadoras. A acusação: violação de direitos autorais, ou para os íntimos, pirataria. A empresa teria que usar músicas controladas pelas gravadoras para construir seus serviços.

O Suno cria músicas com “qualidade de rádio” a partir de comandos de texto. Você pode digitar “uma bossa nova puxada no violão” e magicamente a música é feita, cantada em inglês ou qualquer outro idioma. Já escrevi um artigo aqui na Folha contando como ele funciona.

Essas ações judiciais caíram como uma bomba no mundo da inteligência artificial. Coincidência ou não, o valor de mercado da Nvidia, fabricante dos chips usados ​​para IA, chegou a cair US$ 500 bilhões (!) na mesma semana. Isso pode indicar que existem pedras no caminho da inteligência artificial. E uma delas é o direito autoral.

As gravadoras acusam o Suno de ter usado músicas sem autorização para treinar a IA “em escala quase inimaginável”.

Dizem também que as músicas geradas pela plataforma imitam as originais. Por exemplo, ao pedir por uma música “dançante estilo anos 1970” o Suno gerou uma canção chamada “Prancing Queen”, que lembra o hit do ABBA.

Só para contextualizar, no mês passado o Suno levantou US$ 125 milhões em investimento e hoje tem 12 milhões de usuários pagantes. A pergunta é: a empresa deveria ter pago antes pelas músicas para comprar sua plataforma?

A resposta a essa questão pode afetar todas as empresas de IA. Treinar uma IA com obras autorais seria algo permitido (“uso justo”)? Ou esse treinamento exigiria uma autorização prévia de cada autor? A tendência é que diferentes países irão dar respostas distintas a essa pergunta.

Nos EUA, a aposta das empresas de IA é que os tribunais do país irão dizer que o treinamento com obras autorais é “fair use”, e pode ser feito sem autorização. Países como o Japão estão seguindo um caminho semelhante.

Já outros trilham um sentido diametralmente oposto. É o caso do Brasil. No projeto de lei sobre inteligência artificial que está no Senado, o Brasil deixa muito claro que adquirir uma IA comercial sem autorização prévia dos autores (e sem o devido pagamento) viola o direito autoral, não tendo nada de “fair use”.

Essa disputa poderá ter impacto nas relações comerciais globais, reguladas pela OMC (a Organização Mundial do Comércio). Todos os 164 países membros têm a obrigação de proteger os direitos autorais e seguir a chamada “Convenção de Berna”.

Cedo ou tarde poderá surgir a interpretação de que os sistemas de inteligência artificial treinados sem autorização ou o pagamento prévio dos autores das obras utilizadas teriam sido construídos por meio de um “subsídio”: o não pagamento do direito autoral.

Isso seria inconsistente com as regras da OMC e poderia levar a retaliações, tanto locais quanto internacionais.

Essa questão faz parte do grande jogo travado entre os países sobre a inteligência artificial? Como cantava Doris Day no filme “O Homem Que Sabia Demais”: “O que será, será”.


LEITOR

Já era – ignorar o assunto direito autoral no campo da inteligência artificial

Já é – o direito autoral se torna questão central para o tema de inteligência artificial

Já vem — países se dividindo sobre se treinar uma IA com obras autorais é permitido ou não


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FOLHA DE SÃO PAULO

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