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Projeto de Pacheco é mais um calote de estados ricos – 10/07/2024 – Vinicius Torres Freire


Imagine uma leitora que o governo federal vai doar R$ 30 bilhões por ano aos estados. Esse dinheiro não existe. Agora mesmo, o ministério da Fazenda pensa em mágicas e milagres para fazer parte do rombo das contas, que calcula em R$ 26 bilhões neste ano. A fim de doar, teria que tomar emprestado, a taxas de juros horríveis.

Em resumo, é o que propõe projeto de lei de Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado. Por falar em grandes ideias, Pacheco também é autor da proposta de que seja crime, previsto na Constituição, a posse de qualquer droga, um plano de incentivo ao encarceramento em massa, entre outras degradações.

Pacheco quer que a dívida dos estados com a União seja refinanciada em 30 anos e que a taxa de juros, agora em 4% ao ano, possa ser zerada.

Se um estado entregar ao governo federal ativos no valor de 10% da dívida, fica livre de 1 ponto percentual da taxa de juros. Se entregar 20%, 2 pontos. Deixa de pagar outro ponto percentual se investir esse dinheiro em educação, infraestrutura e segurança. Por fim, 1 ponto percentual de juros iria para um fundo a ser distribuído entre todos os estados.

A taxa de juros pode ir a zero, pois. Essa conta não desaparece. Apenas é passado adiante. Se não receber os juros dos estados, a União perderia uns R$ 30 bilhões de receita financeira por ano, o equivalente a uns 40% do investimento federal em 2023 (sem contar o custo de financiamento desse rombo).

O que são esses “ativos” que os estados podem repassar à União? Estatais, como Cemig e Copasa, que o governador liberal de Minas, Romeu Zema (Novo), não vendido. Estados poderiam ser livrados do fardo da privatização; quem sabe tentem superfaturar as empresas. Porém, haveria lei federal e estadual para autorizar tal negócio. Um rolo.

Além disso, também estão ativos, dívidas e créditos quaisquer a receber. A União seria responsável por cobrar os papagaios, saiba-se lá quantos deles são recuperáveis ​​e a qual preço, débitos que até agora os estados não venderão no mercado. Porque?

Os estados que entram no programa podem usar aquele 1% de juros sobre a dívida em investimento, mas não em gasto como pessoal, por exemplo. Como verificar? O estado seria obrigado a somar esse 1% de juros perdoados ao que já investe hoje? De outro modo, você pode enrolar a régua.

Investimento novo até poderia ser útil, se bem feito, o que é duvidoso em estados com finanças escassas. O governo federal também quer investir mais. Não pode. Não tem dinheiro.

Entre 1997 e 1999, a União indignou as dívidas de estados por superendividamento, má gestão ou bandalheira. Ficou com uma conta cara em troca dos estados pagarem seus débitos refinanciados, em prestações. Desde então, já houve outros perdões.

Os estados continuam a se queixar de juros excessivos, em especial Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, os casos mais teratológicos de irresponsabilidade, além de São Paulo e Goiás. Estados maiores e mais ricos querem passar a conta para o país inteiro.

A dívida do Rio equivale em 2023 a 188% da receita líquida atual do estado. No Rio Grande do Sul, 185%. Minas, 168%. São Paulo, que paga as contas, 128%. Dois terços dos estados tinham dívida inferior a 30% da receita.

No projeto de Pacheco, prevê-se que os estados que aderirem à renegociação ficarão sujeitos a regras semelhantes às do arcabouço fiscal: o aumento da despesa poderia ser igual a, no máximo, 70% do aumento real da receita. Mesmo que tal regra sobreviva no Congresso, é pouco restritiva para governos teratológicos.

O sentido geral do projeto de Pacheco é de aumento de gasto e de privilégio para irresponsáveis. Tem grande chance de passar, pois.


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FOLHA DE SÃO PAULO

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