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Era para viralizar, diz CEO sobre demitir ‘esquerdistas’ – 14/07/2024 – Mercado


Thallis Gomes, 37, é figura conhecida no universo empreendedor. Na década de 1990, foi fundador da Easy Taxi, aplicativo de transporte que chegou a funcionar em 35 países e anos depois acabou vendido para a Cabify.

Desde então, Gomes se dedicou a outros negócios e, com frequência, viraliza por declarações polêmicas nas redes sociais (no Instagram, ele tem mais de 760 mil seguidores).

No fim do mês passado, disse em um podcast que não contrata “esquerdistas” para seu negócio atual, a G4 Educação, empresa de cursos de vendas e gestão comercial. Também exaltou “70 horas ou 80 horas por semana de trabalho”.

Foi para viralizar, ele bebeu em entrevista à Folha. “Eu usei um termo mais polêmico porque sabia que iria chamar atenção. A gente vive uma guerra por atenções, então é positivo para o nosso negócio que haja mais atenção e que isso se transforma em vendas”.

O empreendedor disse que a fala não condiciona a vida real da companhia. E não está sozinho nessa.

Lasaro do Carmo Jr., ex-CEO da Jequiti e sócio da Optimize Consulting, publicou nas últimas semanas um vídeo contando que falava para uma candidata a uma vaga “esquecer” sábado, domingos e feriados. Procurado, ele também relativizou as falas.

O empresário afirma que as propostas, irreais, servem como um “teste de inteligência” para saber se os funcionários enxergam a divisão entre vida pessoal e trabalho da mesma forma que ele.

“Nunca foi assim na vida”, disse Do Carmo Jr. à Folha. “Ninguém vai trabalhar sábado, domingo e feriado, ninguém vai ter uma postura dessa”.

Os conteúdos têm em comum a característica de movimentar as redes sociais dos empresários. No caso de Do Carmo Jr., a publicação acumula mais de 95 mil visualizações de 1.800 compartilhamentos.

No Instagram, Gomes começou o “cancelamento” após a repercussão do vídeo recente, afirmando que o episódio geraria boas oportunidades para a sua empresa, e reforçou a indicação para empresários demitirem “esquerdistas”.

“A gente estava ontem até 1h trabalhando, e hoje 8h o escritório estava cheio”, disse no podcast Café com Ferri no dia 26 de junho. “Esquerdista é ‘mimizado’, não trabalha duro e parece que todo mundo deve alguma coisa para ele.”

Gomes afirmou posteriormente que foi mal interpretado na parte do vídeo em que fala: “Se você não meter [sic] 70 horas ou 80 horas por semana de trabalho, você não vai construir nada na vida”. Ele diz que se refere a empreendedores que criam o próprio negócio, e não funcionários.

A G4 Educação tem 3,9 de 5 estrelas na Glassdoor, plataforma de avaliação de empresas por funcionários. O atributo “Qualidade de vida” é o único com classificação abaixo de 3 na página. Já em “Oportunidades de carreira”, a companhia tem média 4.

Um comentário com 180 curtidas diz que a empresa oferece as vantagens de dar conhecimento sobre negócios, expor funcionários a uma rede de empresas e líderes, foco em resultados, bons funcionários e “cultura forte”.

De negativo, o usuário cita “lavagem cerebral tóxica”, ambiente que perpetua “líderes inexperientes e problemáticos”, competitividade em detrimento da colaboração e mistura de política com negócios.

Após a repercussão do vídeo do CEO, a G4 voltou a apontar alvo de investigação do Ministério Público do Trabalho. Em nota, o órgão afirmou que, a partir de denúncia atendida no dia 2 de julho sobre abusos e desrespeitos à legislação trabalhista, foi instaurado procedimento para apurar irregularidades.

Um primeiro inquérito deve investigar possível discriminação por orientação política, religiosa ou filosófica pelo governo. Outra investigação trata da jornada de trabalho e períodos de descanso. O terceiro se concentrará no desvirtuamento da pessoa jurídica.

A empresa afirmou que sempre se decidiu a cumprir todos os requisitos legais na gestão de suas atividades, “prezando pelo bom funcionamento da cadeia de prestadores, fornecedores, colaboradores, alunos e membros de sua comunidade”.

A empresa também disse que está à disposição para prestar esclarecimentos cabíveis e que apresentará defesa.

Para Camilla Junqueira, diretora da Endeavor Brasil, ONG de apoio a empreendedores, “o mundo caminha em direção contrária” à exaltação de longas jornadas de trabalho. A prática também esconde problemas de produtividade nas empresas.

“Países com produtividade muito superior à do Brasil estão discutindo a semana de quatro dias em vez de cinco. Medir a qualidade do trabalho pelo número de horas não é e nunca foi o jeito mais inteligente de avaliar resultados. O que importa é o que o funcionário entrega”, diz Junqueira

Dados do Conference Board mostram que, enquanto nos anos 1980 um trabalhador brasileiro alcançava 46% da produtividade de um norte-americano, hoje essa cifra caiu para um quarto (25,6%), nível equivalente ao de sete décadas atrás.



FOLHA DE SÃO PAULO

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