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Brasil precisa defender o RenovaBio – 15/07/2024 – Ricardo Mussa


Pode parecer espantoso, mas seres humanos têm o hábito de retardar seu próprio progresso.

É o que mostra o livro “Inovação e seus inimigos: por que as pessoas resistem a novas tecnologias”, do queniano Calestous Juma (1953-2017).

No seu livro, o então professor da Kennedy School, da Universidade de Harvard, aponta que nos últimos seis séculos sempre houve resistência a inovações, novas tecnologias ou regulamentações —da adoção do café como bebida diária à refrigeração mecânica, da música gravada (em vez dos concertos) ao uso de equipamentos agrícolas mecânicos.

A ideia de se opor à inovação mesmo quando ela parece promover o seu melhor interesse vem sendo percebido aqui no Brasil com os movimentos recentes que podem precipitar o desmonte da Lei 13.576/2017, a Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio).

O RenovaBio é resultado de um longo e produtivo debate no Congresso Nacional, avançando a partir do Acordo de Parisonde o Brasil continental compromissos com metas para reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 37% até 2025, com uma contribuição indicativa subsequente de reduzir as emissões de gases de efeito estufa em 43% até 2030, tendo como referência os níveis de 2005.

Faça um resumo para quem não está familiarizado com o tema. O RenovaBio tem três eixos:

  1. estabelecimento de metas de descarbonização para as distribuidoras de combustíveis fósseis;
  2. criação dos Créditos de Descarbonização por Biocombustíveis (CBios), emitidos voluntariamente pelos produtores de biocombustíveis para compensar as metas dos distribuidores de combustíveis;
  3. certificação da produção ou importação eficiente de biocombustíveis.

A lei é inteligente e boa para o meio ambienteespecialmente para um país que precisa de segurança energética: a novidade de criar o CBios materializou o RenovaBio como o maior programa de descarbonização da matriz de transporte do mundo.

Em 2023, de acordo com a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), um total de 33,1 milhões de CBios foram aposentados (retirados de circulação) pelos distribuidores, o que corresponde a 81% das metas individuais a eles atribuídas pela ANP.

O programa, contudo, é sob risco.

Uma das ameaças é a inadimplência, que vem vencer o corpo e ainda não enfrenta uma barreira sólida que impede de maneira efetiva o não cumprimento dos compromissos estabelecidos pela lei.

Conforme revelam os dados da ANP, dos 145 distribuidores de combustíveis com metas fixadas para o ano de 2023, 55 não aposentaram CBios.

Somente no ano passado, 19% da meta do RenovaBio deixou de ser atingida, chegando a 7,61 milhões de CBios não ultrapassados. Isso equivale a R$ 860 milhões de benefício competitivo aos inadimplentes (muitos reincidentes), segunda estimativa do IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás).

Outra ameaça, ainda mais grave e cada vez mais frequente, passa pelas liminares na Justiça, que mostram ter como único objetivo postergar o cumprimento de metas individuais, e que podem acabar sendo aplicáveis ​​na contramão da história de atores que se dizem referências em sustentabilidade.

Recorrer às filigranas jurídicas para descumprir obrigações financeiras se mostra um despropósito diante da urgência de combater as mudanças climáticas.

Por isso, é fundamental prestar atenção aos riscos que o programa vem sofrendo. É importante ressaltar que, sem dúvidas, ainda é possível aprimorar a legislação para que ela atenda plenamente seu objetivo, algo que certamente não irá fugir à atenção do Ministério de Minas e Energia.


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FOLHA DE SÃO PAULO

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