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PEC da Anistia expõe medo de que poder deixe de ser branco – 17/07/2024 – Cida Bento


Os primeiros dias desta semana foram marcados pela expectativa de que fosse antecipada a avaliação pelo Senado Federal da vergonhosa PEC da Anistiarecentemente aprovado pela Câmara e que pretende alterar a Constituição para anistiar partidos já condenados pelo descumprimento de cotas para mulheres e pessoas negrasalém e garantir “imunidade tributária” para as legendas.

Felizmente, enquanto esta coluna era escrita, foi divulgada a notícia de que, apesar da pressão dos maiores partidos e dos líderes políticos do Senado, prevaleceu a decisão de deixar a proposta para ser apresentada em agosto, depois do recesso parlamentar.

O risco de aprovação, no entanto, ainda é grande, e para ter a possibilidade de evitá-lo é necessário forte mobilização de todas as forças sociais (políticas) comprometidas —vale aqui um destaque para o Movimento Negro— com a grande conquista democrática representada pela decisão do STF que determinou, em 2022, a aplicação de recursos nas candidaturas de pretos e pardos em valor proporcional ao número de candidatos.

A participação de mulheres e negros na política ainda é minoritária, apesar das cotas, embora tenha crescido nos últimos anos.

Como informa matéria do jornalista Ranier Bragon, publicado recentemente nesta Folhaa Câmara Federal é dominada por homens brancos tanto nos cargos de comando como na quantidade geral, ao passo que apenas 26% dos 513 deputados eleitos em 2022 são pretos ou pardos.

A PEC da Anistia revoga a determinação de que os negros devem receber verba eleitoral de forma proporcional ao número de candidatos e conceder perdão a irregularidades, além de reduzir a verba eleitoral e partidária aos políticos pretos e pardos para 30%.

Enquanto o Brasil não assume a rica beleza de sua identidade africana, a maioria de sua população se torna alijada do conjunto nacional, disse o senador Abdias do Nascimento no discurso de estreia na tribuna do Senado em fevereiro de 1991.

Elisa Larkin Nascimento, companheira e colaboradora de Abdias Nascimento durante os últimos 38 anos de sua vida, destaca que em 1983 ele foi autor de projeto de lei que propunha o ensino da história e cultura africana e negra e estabelecia cotas raciais como táticas no acesso ao ensino superior, ao mercado de trabalho, ao funcionalismo público, ao Itamaraty e às Forças Armadas.

Abdias definia discriminação racial como crime moderno, de lesa humanidade, nos lembra Elisa, que é cogestora do Ipeafro (Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros).

Se há mais de 40 anos tivemos um senador propondo ações afirmativas, nossa expectativa é que esse mesmo Senado não aprove a PEC da Anistia (que os movimentos sociais chamam de PEC da Vergonha) e reconheça a legitimidade de uma distribuição proporcional e equitativa dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, pois resultado de uma luta incansável dos movimentos sociais, em particular do movimento negro, como nos lembra Frei David, da Educafro.

Não é aceitável conceder anistias às legendas partidárias, pois representa um descumprimento dos ditames de justiça e equidade racial que precisam orientar a política brasileira.

Esta emenda, inconstitucional, não confirma as responsabilidades financeiras dos partidos, e os autoriza a funcionar sem transparência. E explicita o temor que muitos parlamentares têm de que o parlamento deixe de ser majoritariamente masculino e branco, como é hoje.

Vale visitar a exposição “Abdias Nascimento – Sujeito Coletivo” para que possamos relembrar de como os senadores podem trabalhar em prol de um país democrático. Organizada pelo Ipeafro, a exposição no Rio de Janeiro apresenta réplicas das pinturas de Abdias em diálogo com painéis inéditos, criadas coletivamente durante quatro edições de oficinas criativas ministradas no local. Nessa exposição, será homenageado o Griô do Samba, Rubem Confete, radialista carioca.

Coluna escrita em parceria com Flavio Carrança


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FOLHA DE SÃO PAULO

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