segunda-feira, outubro 7, 2024
InícioECONOMIABrasil não tem escolha, precisa de infraestrutura, diz CEO - 26/07/2024 -...

Brasil não tem escolha, precisa de infraestrutura, diz CEO – 26/07/2024 – Mercado


Quando um empresária italiana Susanna Marchionni e seu sócio, Gianni Savio, pensam em se tornar acessíveis as cidades inteligentes (cidades inteligentes) no mundo, o Brasil foi o destino escolhido para receber um primeiro projeto-piloto. Mais especificamente, o Ceará. Foi assim que surgiu o Planet Smart City, que completa 11 anos em 2024.

Hoje também na Índianos Estados Unidos e na própria Itália, Marchionni conta que o Brasil foi escolhido em primeiro lugar por estar entre os países com maior déficit habitacional no mundo e por ter capacidade de atrair investimentos no setor. A empresária pondera que, independentemente do lado dos governantes, o país acaba sempre investindo em infraestrutura e habitações, por necessidade.

“Se chegar alguém que fale: ‘a partir do próximo ano, eu não vou investir em infraestrutura, nem fazer casas’, isso vai destruir o país. O Brasil não tem escolha, porque precisa”, diz.

Ainda assim, não é fácil para uma estrangeira, acostumada com os padrões de inflação e juros europeus, viver os terremotos na economia brasileira. Ela conta que é difícil ainda entender esses ciclos, mas está mais habituada e consegue encontrar em ferramentas externas as soluções para a continuidade de sua empresa.

Para Marchionni, o modelo de negócios do Planeta hoje se enquadra em um novo comportamento dos consumidores de imóveis. Segundo ela, os jovens preferem cada vez mais morar em habitações menores para priorizar o acesso a serviços e facilidades. Confira os principais trechos da entrevista.

Como surgiu a ideia do Planet Smart City? Por que vocês escolheram o Brasil como primeira opção para o projeto?

A ideia desse projeto foi do meu sócio. Gianni Savio começou a pensar: “Por que se fala de cidades inteligentes no mundo e ninguém pensa em fazer algo grande que seja realmente ao alcance de todos?”. Os primeiros projetos foram pequenos e dedicados a um público riquíssimo. Pense na cidade de Masdar, nos Emirados Árabes: um apartamento era vendido por US$ 10 mil dólares (R$ 55 mil) ou metro quadrado.

E Gianni começou a pensar que, para ter escalado dentro do que queríamos, era preciso de muito déficit habitacional. Naquele período saiu uma reportagem na revista britânica The Economist que falava dos dez maiores lugares do mundo onde investir. E um era o Porto do Pecém, no Ceará. Eu nem sabia onde era o Ceará. Nunca tinha pisado no Brasil. Então, eu me mudei para lá e foi feita uma análise junto com a Universidade de Milão sobre o desenvolvimento da região. Aí buscamos uma área e lançamos o projeto-piloto. E eu me apaixonei pelo Brasil.

A ideia desde o início era lançar esses projetos não apenas pensando em tecnologia, mas em utilizá-la como um meio e não como um fim para mudar a vida das pessoas. Então, tem também o planejamento urbano, da mesma forma que pensamos no meio ambiente e no conceito de inclusão social.

Então, não é um processo de construção que vocês fazem o trabalho de atrair também o comércio e a indústria?

A gente faz uma construção desde o começo que se chama “hub de inovação”. São mais de mil metros quadrados com uma parte de espaços compartilhados para os moradores. Portanto, tem biblioteca, locais de empréstimo de objetos e ferramentas, tem espaços de coworking, cozinhas compartilhadas. E as pessoas podem usar tudo gratuitamente.

Nesse “hub de inovação” a gente também deixa áreas para lojas, que alugamos. Mas nos primeiros meses é gratuito, para que o comércio assim que o projeto fique pronto. Seria um problema o morador chegar e não ter comércio. Ou o lojista chegar e não ter moradores. Portanto, tentamos alimentar esse ecossistema.
E isso faz parte de um programa mais amplo, ligado ao nosso conceito de soluções “smart” [inteligentes].

No centro de competência temos esse tempo que pensamos quais são as melhores soluções que podem ser integradas, pilar por pilar. São quatro pilares: meio ambiente, arquitetura, tecnologia e a parte social, que eu considero aquilo que mais impacta a vida de todos. E quem cuida é o nosso tempo de “community manager” [gerente de comunidade]que interage com os moradores para tentar criar boas práticas.

Esse seria o pós-venda, então?

Nosso trabalho sempre continua depois da venda. Se você quiser fazer um andar a mais em sua casa, o community manager te ajudará a apresentar o projeto na prefeitura para não fazer sem alvará. Ele organiza cursos, festas, eventos, oficinas e até a criação da associação de moradores. E isso é gratuito.

E como vocês financiam isso? Como se torna algo rentável?

A gente tem, como carro-chefe, um aplicativo gratuito, o Planet App, que é o painel de controle do bairro, ou do condomínio no caso de projetos verticais. Por ele dá para organizar festas e eventos, o aplicativo mostra todos os livros disponíveis na biblioteca, e dá para reservar o livro. Ou se quiser uma furadeira amanhã, ela vai ver no aplicativo.

Mas como tudo isso é gratuito? Dentro do aplicativo as empresas podem vender produtos e serviços e a Planet recebe uma comissão de quem vende. E quanto mais ganhos, mais posso oferecer serviços legais.

Vocês aqui no Brasil há 11 anos, já passaram por alguns ciclos econômicos. E se tem um setor que sofre com ciclos econômicos é o imobiliário. Como lidar com isso?

É rir para não chorar… Quando eu falo qual é a taxa de juros mensal do Brasil, o italiano acha que é anual. Na Itália a gente chegou a ter juros de 2% ao ano. Aqui isso é mensal. No período em que o IGP-M [Índice Geral de Preços – Mercado] chegou esses valores absurdos, a gente colocou um teto de juros. Porque, afinal, nossos compradores de lotes foram impactados de uma forma tão grande que chegaram a ser inadimplentes de forma exagerada.

Então a gente tomou a decisão de bloquear os juros. E essa decisão impede um pouco nosso lucro, lógico. Mas nós, europeus, temos uma constituição um pouco diferente comparada ao brasileiro. Para nós, às vezes, é mais importante aumentar o capital de giro e reduzir um pouco a lucratividade.

Este é um dos momentos mais desafiadores que você está vivendo como empresa aqui no Brasil?

É uma coisa que, para o europeu, é difícil de entender. É um movimento tipo terremoto. Nós não estamos acostumados, nem financeiramente nem psicologicamente. No começo, eu sofri. Olha, quando eu cheguei aqui o euro era R$ 3, agora está pulando para R$ 6.

Logo no início, quando vocês chegaram, o Brasil viveu uma grande crise econômica também, entre 2015 e 2016.

Aquela crise foi pior. Foi muito forte. Ela foi tão grande que passou de uma crise econômico-financeira para uma crise social. Quando você ultrapassa um limite de números e de prazo, vira crise social. E quando vira social, é muito mais demorado para sair. Quando impacta no social, as pessoas param de acreditar. Reduzem totalmente os investimentos, o consumo, tudo de uma forma tão forte que a retomada é muito lenta. Desta vez, não percebi o impacto da mesma forma.

Como você vê hoje o ambiente político e econômico no Brasil e como isso impacta seu setor?

O país, para um construtor, tem uma vantagem: seja um governo de direita ou de esquerda, o Brasil precisa de infraestrutura e de habitações, devido a esse enorme déficit habitacional. Portanto, se você faz uma análise dos últimos anos, dos últimos 20 anos, ninguém penalizou o setor. Todos precisam dele.

Se chegar alguém que fale: “a partir do próximo ano, eu não vou investir em infraestrutura, nem fazer casas”, isso vai destruir o país. O Brasil não tem escolha, porque precisa. Portanto, imagino que para os próximos 20 anos isso não vai mudar. Independentemente de um lado ou do outro [da ideologia do governo].

Pensando em comportamento do consumidor, o que você repara de tendência aqui no Brasil?

Tem uma coisa que é fortíssima no Brasil, mas eu estou percebendo também nos outros países onde a gente opera: as pessoas tendem a morar em habitações —casa ou apartamento— um pouco menores, porque todos querem serviços compartilhados.

Não é só aqui no Brasil. Na Índia é igual, nos Estados Unidos… Você morava em 70 m², aí pensa: “Será que posso comprar uma coisa mais bem localizada de 50 m² e uma máquina de lavar ficar lá embaixo? A furadeira, não preciso ter um armário para todas aquelas ferramentas, posso alugar. Quero fazer um jantar com 20 pessoas? Vou lá na cozinha compartilhada, que é muito bem organizada”.

Em cada lugar do mundo estamos percebendo que, quanto mais serviços compartilhados você oferece, mais as pessoas querem.

Na sua visão, isso tem a ver com uma mudança de comportamento das pessoas, que estão priorizando mais serviços, mais facilidades e menos bens?

Com certeza. O jovem mora em um apartamento menor, então, tem menos coisas. Mas tem mais acesso a experiências diferentes. Acho que isso é cultural desta última geração. Inevitavelmente as pessoas depois repassaram para os pais. É uma visão diferente, é ligada a gastar menos, é ligada ao meio ambiente. Por esse motivo, é uma coisa que impactou também as faixas de renda mais altas.


RAIO-X

Susanna Marchionni, 52

Formada em economia, a empresária iniciou sua carreira na Itália, em 1996, gerenciando compra, venda, renovação e revitalização de projetos para empresas. Em 2015, Marchionni mudou-se para o Brasil para tocar o Planet Smart City. Atualmente, é CEO da companhia no país e membro do conselho de administração da empresa em Londres, onde está a sede da empresa.



FOLHA DE SÃO PAULO

ARTIGOS RELACIONADOS
- Advertisment -

Mais popular