segunda-feira, outubro 7, 2024
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PL da Licença-Paternidade avançada; governo não sabe como pagar



O projeto de lei que visa a licença-paternidade em até 60 dias avançou no Senado Federal, mas ainda tem um longo caminho a percorrer. Considerada uma política pública de fácil implementação e com resultados positivos na economia a longo, médio e curto prazo, o maior desafio é determinar onde virá o financiamento para custear o benefício.

O parecer da relatora, senadora Damares Alves (Republicanos-DF), foi aprovado na Comissão de Direitos Humanos (CDH), em 12 de julho, antes do recesso. De forma progressiva, a proposta prevê que os pais fiquem 30 dias em casa após a chegada de um filho nos dois primeiros anos de vigência da lei. No terceiro e quarto ano da lei, o prazo aumentaria para 45 dias, chegando a 60 dias a partir do quinto ano. Os pais envolvidos em casos de violência doméstica ou familiar ou de abandono de filhos não recebem autorização ou benefício, segundo o texto da senadora.

“Para cada dólar investido na Primeira Infância, há um retorno de US$ 7. Há estudos mais recentes mostrando números maiores, até US$ 16. Porque o melhor investimento que a sociedade pode fazer é investir nas pessoas, pois traz mais retorno do que investir em infraestrutura e tecnologia, por exemplo. Afinal, são as pessoas que geram isso”, afirma Rodolfo Canônico, diretor-executivo do Family Talks, ONG que faz advocacia em políticas públicas familiares.

Canônico explica que, embora não haja um projeto específico sobre o retorno econômico da licença-paternidade, os gestores públicos decidem o auxílio técnico, como um investimento na Primeira Infância, que beneficia crianças de zero a seis anos. “Os benefícios sociais tendem a superar os custos gerados. Tal como a licença-maternidade. Caro seria para a sociedade se o filho não tivesse a oportunidade de estar com a mãe nos primeiros meses de vida”, destaca.

Benefícios vão de saúde da mulher no pós-parto à conclusão do percurso escolar da criança

“A Primeira Infância não se retoma aos benefícios oferecidos pelo Estado como creches ou parques. Para que uma criança se desenvolva bem, ela precisa de uma família que funcione de forma adequada. E uma das principais necessidades da família é tempo. Nenhum pai vai poder interagir com os filhos se não tiver tempo para isso”, enfatiza Marcelo Couto, doutor em Ciências Sociais pela UCSal e secretário municipal da pasta de Família, Cidadania e Segurança Alimentar de Osasco (SP).

Ainda segundo Couto, o tempo maior de convivência entre pais e filhos tem repercussões no desenvolvimento cognitivo e social da criança. Essa convivência também tende a reduzir comportamentos de risco – envolvimento com álcool e drogas, por exemplo – e até melhorar o desempenho escolar dessas crianças. Para o especialista, o Poder Público também deve promover iniciativas de políticas para que os pais desenvolvam habilidades parentais. Desta forma, há mais garantia de que este tempo entre pais e filhos seja de qualidade.

O relatório do “Grupo de Trabalho sobre a Regulamentação e a Ampliação da Licença-Paternidade” da Câmara dos Deputados mostra que a presença do pai em casa durante duas semanas ou mais está associada a um maior envolvimento emocional dele com os filhos, menor índice de estresse para ambos os pais e menor índice de depressão pós-parto para mães.

Hum estudo feito nos Estados Unidos, que acompanhava crianças por 30 anos, possibilitou que os pesquisadores conseguissem prever, com 77% de precisão, quais crianças abandonariam a escola antes do ensino médio. A única variável usada pelo grupo era a qualidade dos cuidados dos pais com os filhos nos primeiros 3 anos e meio de vida. “Ou seja, um dos fatores mais determinantes para a permanência da criança na escola e a conclusão de seu percurso escolar é qualidade da interação com os pais. E isso ocorre num período em que boa parte das crianças nem entrou na escola”, explicou Couto. Ainda segundo a pesquisa, a educação nos primeiros anos de vida tinha influência no nível de escolaridade de um jovem de 23 anos.

De onde vai sair o dinheiro?

A proposta ainda precisa passar pela Comissão de Constituição e Justiça, Comissão de Assuntos Económicos e Comissão de Assuntos Sociais. O governo, figura crucial para o avanço do projeto, não se opõe ao mérito da proposta, mas ainda não determinou de onde deverão sair os recursos necessários.

A fonte de recurso mais cotada para custear o benefício paterno seria o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), responsável pelo pagamento da licença-maternidade. Apesar disso, as projeções de longo prazo do órgão são bem preocupantes. O rombo da Previdência deve chegar a R$ 326,2 bilhões em 2024, segundo o Balanço Geral da União de 2023, divulgado pelo Tesouro Nacional. O envelhecimento populacional acelerado e o avanço dos gastos são os principais motivos do déficit.

Em relação aos custos com correção, o cenário é mais otimista. Bastaria replicar aos pais o que já é feito em relação ao pagamento do auxílio às mães. A organização das empresas para beneficiários dos trabalhadores também não deve ser complexa, e funcionaria de maneira semelhante ao período de férias dos celetistas. A diminuição das taxas de fecundidade e natalidade, conforme apontam os últimos dados do IBGE, também deve diminuir os problemas das empresas.

“Esta é uma política pública de resultado garantido, diferente de outras. Porque é um recurso que vai diretamente para uma pessoa que está com uma criança. O dinheiro vai cair na conta do cidadão para ele estar com o filho. Isso potencializa os resultados pretendidos”, ressalta Canônico.

Eleitorados criticam Damares e Tabata por trabalharem juntas

Em dezembro de 2023, o Supremo Tribunal Federal (STF) estipulou um prazo de 18 meses para que o Congresso Nacional regulamentasse a licença-paternidade. O direito, previsto pela Constituição Federal há 35 anos, necessita da aprovação de uma lei específica. Atualmente, a licença-paternidade é de 5 dias – um prazo temporário que a Constituição Federal localiza. Empresas cidadãs e órgãos públicos oferecem 20 dias de licença aos pais. Algumas empresas privadas, como o Grupo Boticário e o Nubank, já oferecem 120 dias.

A Frente Parlamentar Mista pela Licença-Paternidade foi lançada em junho no Congresso Nacional. Presidida por Tabata Amaral (PSB-SP) e com Damares Alves como vice-presidente, as parlamentares foram criticadas pela aliança em prol do projeto. “A gente vê mulheres da esquerda e da direta se unindo, deixando desavenças e discordâncias de lado, para falar do que importa”, frisou Tabata em seu discurso na Comissão de Direitos Humanos.

Após a aprovação do projeto, Damares Alves lamentou as críticas recebidos pela sua base conservadora. “Vocês não sabem o quanto eu sofri porque fui fotografada e sou vice da Tabata Amaral. Eu perdi amigos, seguidores e parceiros porque eu me aliei a Tabata Amaral para proteger crianças, mulheres e famílias do Brasil”, disse a senadora emocionada. Pedro Campos (PSD-PE) e Benedita da Silva (PT-RJ) também se envolveram na frente dos trabalhos em prol da licença-paternidade.



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