domingo, outubro 6, 2024
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Interesses políticos barram impeachment de Alexandre de Moraes



Desde que Rodrigo Pacheco (PSD-MG) assumiu a presidência do Senado pela primeira vez, em fevereiro de 2021, foram protocolados na Casa 53 pedidos de impeachment de ministro contras do Supremo Tribunal Federal (STF). A maioria das petições (21), de cidadãos comuns ou políticos, condena atitudes praticadas pelo ministro Alexandre de Moraes. Ele ainda será alvo de mais um pedido de impeachment, previsto para ser apresentado em 9 de setembro, como desfechos da campanha conquistada pelo senador Eduardo Girão (Novo-CE) e embalada por recentes revelações de supostos abusos homicídios em inquéritos do STF.

Reportagens da Folha de S. Paulo publicadas nesta semana revelaram trocas de mensagens entre Moraes e colaboradores próximos do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do STF, entre agosto de 2022 e maio de 2023. Elas sugerem que Moraes determinou um órgão do TSE, que deveria ser independente, a produção de relatórios enviados para embasar suas decisões. As mensagens também mostram práticas de pesca probatória, abuso de autoridade, possíveis fraudes de prova e uso do TSE por Moraes para atuar contra adversários políticos, onde ministro o aparece na figura de vítima, acusador e juiz, simultaneamente.

Isso gerou um novo impulso para o impeachment do ministro. Mas analistas e parlamentares destacam um obstáculo: até agora, todos os pedidos semelhantes envolvendo ministros do STF foram arquivados por Pacheco, com base em pareceres de mérito da Advocacia-Geral do Senado, que deveriam apenas avaliar as formalidades. Deputados e senadores, sobretudo da oposição, veem nesse padrão a omissão ou a conivência com possíveis abusos de autoridade, além de desrespeito às prerrogativas constitucionais do Senado, única instituição capaz de exercer controle externo de juízes de tribunais superiores.

Os motivos alegados por Pacheco para barrar os pedidos de impeachment incluem a falta de “justa causa” ou fundamentos legais suficientes que justifiquem a abertura de um processo contra os ministros até o esforço para “preservar a independência e harmonia entre os poderes”. Ele argumentou que evitar julgamentos com base em divergências ideológicas poderia comprometer a estabilidade institucional e política do país ou gerar insegurança jurídica para enfrentar desafios sociais e econômicos.

Pacheco cogitou vaga no STF, governo de Minas e ministério de Lula

Na prática, Pacheco vem optando por manter boas relações tanto com o Executivo quanto com o Judiciário. Seu comportamento, alegações críticas, sempre mirou alvos estratégicos para quando ele deixou a presidência do Senado, em fevereiro de 2025. Pacheco se posicionou como candidato a uma das duas vagas abertas no STF no atual governo, mas acabou não sendo escolhido pelo presidente da República . Na sequência, articulou a sua candidatura ao governo de Minas Gerais nas eleições de 2026, numa possível futura aliança com o PT.

Há especulações ainda de que o senador poderia integrar o ministério de Lula em 2025. Tais movimentos ainda seguem instruções diante das constantes mudanças de cenário. De toda forma, Pacheco, como presidente do Senado, segue empenhado na aprovação de pautas de interesse do Judiciário. O maior exemplo disso é o projeto de reajuste automático adicional de 5% dos intervalos de juízes a cada cinco anos, os quinquênios.

Mas essas parcerias com os outros poderes resultam em danos abalos na razão da necessidade de Pacheco defender competências do Congresso contra extrapolações dos demais poderes. Nesse sentido, ele desenvolveu integral ou parcialmente duas medidas provisórias do Executivo que tratavam de aumento de impostos no início do ano. O presidente do Senado também substituiu a dianteira para a renegociação das dívidas dos estados com a União com um projeto de lei complementar, o que criou pressão com o Ministério da Fazenda, preocupado com o impacto fiscal da medida.

Para fazer frente às cobranças de senadores oposicionistas e independentes e até para resguardar competências do Senado, Pacheco vem liderando propostas futuras que soam como consequência ao ativismo judicial, com destaque para o projeto que limita as decisões monocráticas do STF, aprovado em novembro e sob análise da Câmara. A proposta de emenda constitucional (PEC) proíbe os ministros de suspender unilateralmente leis ou ações do Executivo e Legislativo, exigindo que tais decisões sejam tomadas pelo colegiado dos 11 membros da Corte.

Outras iniciativas no Senado visam estabelecer mandato fixo para os ministros do STF, em vez do modelo atual em que eles servem até a aposentadoria compulsória aos 75 anos, e mudanças no processo de nomeação deles. Essas medidas refletem um movimento do Legislativo para tentar equilibrar os poderes, especialmente em resposta às decisões recentes do STF que causaram atritos com o Congresso. Eles em diferentes estágios de tramitação e enfrentam desafios para serem aprovados, mas mostram uma clara insatisfação com o excesso de interferências.

Negativa de Pacheco também revela cautela da maioria, diz especialista

Para o cientista político Leandro Gabiati, diretor da Dominium Consultoria, não se pode prever a atuação de Pacheco no episódio envolvendo Alexandre de Moraes apenas a um desejo pessoal, embora reconheça que os interesses do senador também devem ser considerados.

“Ele tenta refletir a posição da maioria dos 81 senadores. Sua busca por uma função institucional se baseia na análise dos prós e contras de qualquer situação que precisa enfrentar como líder de um poder. Neste momento, ele está em diálogo com líderes partidários e outras figuras importantes, avaliando diferentes posições e percebendo que não há apoio suficiente para avançar com iniciativas como uma CPI ou impeachment”, destacou.

Na avaliação do professor, o episódio divulgado pela imprensa envolveu Moraes causa um desgaste imediato e significativo à imagem do ministro e, moralmente, à confiança do STF. Ainda assim, o especialista acredita que os outros 10 membros da Suprema Corte continuarão a apoiar Moraes, sem chance de divisões internas. Por outro lado, no Congresso, especialmente no Senado, que é responsável pela autorização e possível afastamento de ministros, as pressões são maiores.

“O caso de Moraes deve ter maior impacto entre os senadores. No entanto, ainda não vemos disposições para a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) ou a acessibilidade de um pedido de impeachment, apesar dos aspectos já iniciados”, afirmou.

Gabiati ressalta, contudo, que a chance de uma ocorrência do Congresso, liderada pela oposição, se ampliaria se informações mais contundentes foram reveladas sobre a atuação do ministro no TSE e STF, no sentido de dar um lado na eleição presidencial de 2022. Por enquanto , prevaleça o tom de cautela, como se verifica nas poucas manifestações públicas de senadores sobre a questão.

Ataque do STF a emendas pode mudar cálculos para as eleições no Senado e na Câmara

O cientista político Leonardo Barreto, diretor da consultoria I3P, avalia que a pressão pelo impeachment de Moraes esbarra em um contexto mais amplo de crescente tensão entre os poderes Legislativo e Judiciário. Ele destaca que a questão central, que interfere na sucessão dos atuais presidentes da Câmara e do Senado, está relacionada às decisões do ministro Flávio Dino, do STF, de bloqueio verbal do Orçamento da União para deputados e decisões do Senado.

“Já havia uma sensação de que algo estava para acontecer, mas poucos esperavam que Dino adotasse uma postura tão radical ao suspender as emendas impositivas, o que desestabiliza tudo”, afirmou.

Segundo Barreto, sem as emendas impositivas, Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara, perde grande parte do controle sobre sua base, tornando sua sucessão incerta. A mesma situação vale para Davi Alcolumbre e Rodrigo Pacheco, que têm sido aliados importantes do governo, inclusive facilitando a aprovação de Dino para o STF.

“Eles serão cobrados por seus pares”, após o especialista, acrescentando que a única saída para os presidentes das duas Casas e líderes partidários é retaliar. “O jogo sucessor foi duramente impactado. Turbulência à vista”, alertou.

Não por acaso, Pacheco e Lira aproveitaram um encontro social na noite de quarta-feira (14) em Brasília para uma conversa reservada, onde, segundas informações de bastidores, discutiram formas de preservar as prerrogativas dos parlamentares diante do avanço dos magistrados.

Pacheco tem conexões com o mundo jurídico e pode voltar à advocacia

Pacheco não é seu segundo mandato à frente do Senado. Em 2021, ele foi eleito pelos colegas com o apoio de uma ampla coalizão de partidos, sucedendo Davi Alcolumbre (União Brasil-AP). Já em 2023, sua reeleição cumpriu compromissos para conter o ativismo judicial. Agora, a mesma pressão se repete em sua sucessão, com a volta virtual de Alcolumbre em 2025.

Formado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas), Pacheco construiu carreira de destaque na advocacia. Ele é especializado em Direito Penal e tem ampla experiência em casos criminais de grande relevância. Antes de ingressar na política, atuou em casos de alta complexidade e obteve reconhecimento no meio jurídico.

O senador já foi conselheiro da seção mineira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG) e ainda tem importante base de apoio dentro da categoria. Como presidente da Comissão de Direito Penal da OAB Nacional, Pacheco se tornou voz influente no meio jurídico.

Caso não conteste nenhuma carga política nem ganhe um ministério de Lula, após o término de seu mandato parlamentar, a hipótese mais provável é que volte a exercer sua profissão.



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