sábado, outubro 5, 2024
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No Recife, voto evangélico é disputado por direita e esquerda



A disputa pela prefeitura de Recife (PE) está colocando o segmento evangélico em lados opostos dos espectros políticos. Representando à esquerda, o prefeito João Campos (PSB) se aproxima de lideranças para ganhar a simpatia do público. Já pela direita, o ex-ministro do Turismo Gilson Machado Neto (PL) garantiu a candidatura a vice de Leninha Dias, empresária evangélica e ex-diretora da rádio Maranata.

A racha dentro dos segmentos ocorreu quando a rádio acusou a campanha de Machado de uso indevido da imagem da empresa durante o anúncio de Leninha como candidatura na chapa do Partido Liberal, ocorrido em 2 de agosto.

“Está aqui ao meu lado uma vice-prefeita que não será decorativa na minha chapa. A Leninha Dias foi escolhida para ser uma mulher guerreira, uma mulher que, feita eu, sofreu na vida para poder conseguir as coisas. É como se diz: uma mulher que se fez sozinha“, afirmou Gilson Machado.

Segundo o diretor da rádio Maranata, André Carvalho, o veículo não autorizou o uso de seu nome ou de colaboradores durante a campanha. Em nota enviada ao blog do jornalista Jamildo Melo, o diretor afirmou que “Maranata sempre se pautou pela ética e compromisso com a verdade e não aceitará jamais que seu nome ou sua marca sejam usados ​​de forma irresponsável na tentativa de se autopromoverem”.

Por outro lado, na última sexta-feira (16), primeiro dia de campanha eleitoral, Carvalho declarou apoio ao prefeito socialista. Em comunicado enviado à imprensa local, ele afirmou que esteve ao lado de João Campos desde 2020 e que não poderia ser “incoerente”.

“Apesar de entender que ainda há coisas que precisam ser feitas, creio que, dando mais quatro anos ao atual prefeito, ele continuará executando um ótimo trabalho para o Recife. Por esses motivos, João Campos tem o meu apoio”, disse o diretor da rádio Maranata.

O peso do voto evangélico pode fazer sentido quando a vereadora Michelle Collins (PP-PE), atualmente substituindo a deputada Clarissa Tércio (PP-AL) na Câmara dos Deputados, foi aventada como possível candidata à prefeitura do Recife.

Antes das convenções partidárias, a sigla comandada pelo deputado federal Eduardo da Fonte (PP-PE) chegou a estudar a previsão da candidatura. Sendo mulher e evangélica, a avaliação era de que um parlamentar teria mais apelo junto ao eleitorado local. No entanto, da Fonte preferiu apoiar Daniel Coelho (PSD), a candidata da governadora Raquel Lyra (PSDB).

Esquerda usa pragmatismo para se aproximar dos religiosos

Uma análise sobre o comportamento do voto evangélico na eleição da capital pernambucana revela uma situação complexa, no qual as alianças políticas locais não seguem uma divisão clara entre esquerda e direita. Segundo o cientista político Arthur Leandro, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a figura de João Campos não representa uma esquerda tradicionalmas sim uma articulação política que transcende essa categorização simples.

“João Campos não é exatamente à esquerda aqui. Ele se coloca como um jogador fundamental na política pernambucana, articulando diversas tendências políticas. Ele pode jogar em dois campos.”

Ele acrescenta que o apoio de evangélicos a Campos mostra que o prefeito busca flexibilizar sua base em nome de alianças locais. “A divisão entre os campos políticos é mais fluida do que parece. João Campos, com sua articulação política, demonstra que o voto evangélico pode se dividir entre candidaturas que, apesar de aparentarem antagonismo, operam dentro de um espectro político pragmático e adaptável.”

Os candidatos precisam pensar como os evangélicos pensam

A cientista política Priscila Lapa destacou que o eleitorado evangélico tem uma importância estratégica crescente na disputa política, tanto em termos quantitativos quanto qualitativos. Segundo Lapa, o aumento do número de participantes que se identificam como evangélicos levou os candidatos a traçarem estratégias com base nas características únicas desse grupo.

“O candidato que vai atuar para atrair os votos desses segmentos precisa parecer e pensar como esse segmentos, porque não há margem para diálogo”, afirmou. Lapa também aponta que os evangélicos desenvolveram uma capacidade particular de transitar entre o diálogo presencial e o digital, utilizando exclusivamente as mídias sociais para financiar a participação e os valores.

“Eles já usam intensivamente esses meios para difundir essas referências a essas verdades, então a utilização desses canais para fins político-eleitorais se tornou quase que uma consequência natural”, observou. Além disso, ela sublinha que esse eleitorado busca representantes que compartilhem integralmente de suas pautas e visões de mundo, tornando difícil a adesão a candidatos que não se alinham completamente com suas expectativas.

Evangélicos disputam segunda maior cidade de Pernambuco

Em Jaboatão dos Guararapessegunda maior cidade do estado e localizada na Região Metropolitana do Recife, uma disputa entre evangélicos é representada por um debate entre duas famílias: os Ferreira e os Tércio.

Buscando a reeleição, o prefeito Mano Medeiros é apoiado pelos Ferreira, cujos expoentes são o deputado federal André Ferreira (PL-PE), o deputado mais votado em 2022, e o ex-prefeito de Jaboatão Anderson Ferreira (PL). Apesar de ser um grupo político consolidado no estado, a família ligada à Assembleia de Deus voltou aos holofotes para apoiar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Do outro lado, a deputada federal Clarissa Tércio (PP-PE) é outro expoente da política pernambucana, também proveniente da Assembleia de Deus. Sendo a segunda parlamentar mais votada na última eleição, ela disputou com Mano o apoio dos evangélicos de Jaboatão.

Comentando a situação, Priscila Lapa explica que o crescimento do segmento evangélico – e seu avanço em bancadas e cargas executivas – trouxe uma maior fragmentação e competição interna. A divisão de atenção entre os candidatos reflete uma disputa discursiva e de liderança, em que “a divisão é quase que uma consequência do crescimento”.

“Quanto mais crescer, mais vai ter divisões. Talvez isso faça muito sentido para eles. Diferentemente do que acontece na Igreja Católica, onde há um poder central muito forte que exige pautas para a política, o segmento evangélico é todo fragmentado. Essa fragmentação amplia as possibilidades de alianças, mas também fragmenta. Isso pode resultar exatamente no que estamos vendendo agora: grupos religiosos dentro do mesmo município e distrito eleitoral disputando o poder”, disse a cientista política.



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